sexta-feira, 16 de outubro de 2009

FOME

Na minha rua existem casas,
A minha está elevada acima dela.
Paira no ar como um balão.
Tenho de subir sessenta e oito degraus
para aceder ao céu, à minha porta.

À noite emergem do esgoto os ratos.
De esgoto em esgoto os ratos
avançam e a lua resplandece.
Três homens, três, de luvas
enlutados, conduzem um pequeno
carro de mão, trazendo pela trela
o pequeno cão.

Abrem um a um os contentores,
libertam o lixo e seus vapores.
Montam um esplanada com chapéu de noite
e remexem em sacos, pilhas, maravilhas,
couves-flor, cadeiras de baloiço,
ferros a vapor e separam restos,
organizam tudo, antes da partida.

E eu, no meu apartamento,
covil suspenso no ar,
a seis metros da rua,
faço disso poesia,
dessa fome a meus pés,
descalça na noite fria.

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