sexta-feira, 13 de novembro de 2009

CONVENTOS

Como uma monja que se recolhe, ou uma criança que explora uma torre, subiu as escadas, deteve-se na janela, chegou ao quarto de banho. Ali estava o pavimento verde e a torneira a gotejar. Era um vazio perto do centro da vida; um sótão. As mulheres devem deixar os seus adornos. Ao meio-dia, devem despir-se. Espetou o grampo na almofada e deixou o chapéu amarelo de plumas sobre a cama. Os lençóis passados estendiam-se numa longa faixa branca. A sua cama seria cada vez mais estreita. A vela queimara-se até metade, pois lera até tarde as "Memórias do Barão de Marbot". Lera pela noite dentro, até à retirada de Moscov. Pois o Parlamento funcionava até uma hora tão avançada que Richard insistia em que ela, depois da doença, repousasse sem distúrbios. E, na verdade, preferia ler tranquilamente a retirada de Moscov. Ele sabia-o. De modo que o quarto era um sótão, a cama estreita; e ao ficar ali deitada, a ler, pois sofria de insónia, não podia despojar-se de uma virgindade preservada desde a infância e que lhe aderia ao corpo como uma túnica. Adorável quando menina, chegou, súbitamente um instante - junto ao rio, nos bosques de Clieveden, por exemplo - em que por alguma retracção desse frio espírito, se sentira falhar. E depois, em Constantinopla, e outras vezes mais. Via o que lhe faltava. Não era beleza; não era inteligência. Era essa coisa central, que se comunica; alguma coisa de cálido que quebra a superfície e encrespa o frio contacto de homens e mulheres, ou de mulheres entre si.

in Mrs. Dalloway, Virgínia Woolf, pag. 30-31, Ed. Livros do Brasil

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